A Covid-19 transformou a rotina da população e o trabalho de todos os profissionais da área da saúde. É fato que eles estão sempre preocupados com o nosso bem-estar, mas como está o bem-estar de cada um deles, ainda mais com a fase roxa decretada a pouco tempo? Você sabe o que é a Síndrome de Burnout? O esgotamento é algo que precisa ser discutido e por isso entrevistamos o médico Dr. Lauro Acosta, CRM-39356, do residente de Psiquiatria da Secretaria de saúde de São José dos Pinhais, em Curitiba – PR. Confira a entrevista agora.

CM: O que é a Síndrome de Burnout?

LA: A Síndrome de Burnout, também conhecida como Síndrome do Esgotamento Profissional, consiste em um distúrbio psíquico deflagrado por esgotamento físico e mental intensos provocados por condições laborais desgastantes, como exemplo de tais condições, podemos citar as enfrentadas pelos profissionais de saúde na linha de frente de combate à pandemia de Covid-19. Eles estão diante de jornadas de trabalho extensas, com poucos recursos humanos e materiais, aumento crescente do número de casos e mortes e a frustração pela falta de amparo da parte do Governo e de parte da população, que tem mantido aglomerações e não respeita as recomendações de cuidado, como uso de máscaras, higiene das mãos e distanciamento social.

CM: Quais são os sintomas desse esgotamento?

LA: Os sintomas convergem para a sensação de esgotamento emocional e físico, expressos através de sintomas como dor de cabeça, irritabilidade, dificuldade de concentração e memória, oscilações do humor, dificuldades para relaxar e dormir, sintomas digestivos, preocupação excessiva, tremores, sudorese e até depressão.

CM: Como está o seu psicológico e o dos seus colegas que são linha de frente durante essa Pandemia?

LA: Manter a saúde mental em dia ao longo deste ano tem sido um desafio, é impossível manter-se indiferente diante da persistência da pandemia, do medo em contrair a infecção e vir a desenvolver a forma grave da doença, do aumento do número de casos e mortes, da lenta vacinação da população, além das preocupações sobre o futuro que nos aguarda. No começo da pandemia entrei em um modo obsessivo para com as notícias e percebi uma preocupação e pessimismo crescentes em mim, por isso, precisei “pisar no freio”, o  que eu tenho feito é evitar leituras constantes sobre notícias relacionadas à pandemia, seleciono um período do dia para me informar (através de fontes confiáveis) e tenho procurado manter uma rotina mais próxima do normal, sempre que possível. Prática de atividades físicas (passei a maior parte do ano me exercitando em casa através de lives) e atividades lúdicas individuais, que me ajudam a espairecer, quando posso, como leituras, cozinhar, assistir algo leve, além da meditação, outrossim, manter as regras de distanciamento, usar máscaras e lavar frequentemente as mãos me ajudam a manter uma segurança. Quanto aos colegas na linha de frente, é visível o esgotamento e os prejuízos na saúde mental. Profissionais da área já rotineiramente são submetidos a rotinas desgastantes e durante a pandemia tais rotinas foram intensificadas. Piora do sono, ansiedade, depressão, preocupação em contaminar colegas e familiares têm sido frequentes, muitos estão até isolados de suas famílias pela ânsia em evitar transmissão para seus entes queridos. Tem sido dífícil.

CM: Quais foram as principais mudanças na rotina de vocês em questão de horários, plantões e EPI’s, por exemplo?

LA: Os plantões são marcados pelo aumento do número de atendimentos e manejo de casos graves nos pronto-atendimentos, clínicas e hospitais. Isso gera desgaste, rotina intensa e maior necessidade de habilidades clínicas e pessoais, o uso de EPI tem sido imprescindível,  como: máscaras, protetores faciais, aventais, luvas, toucas. Um momento de tensão é a hora de retirar os EPI’s, que já é conhecida como importante fonte de contaminação. É preciso seguir uma sequência minuciosa e cuidadosa para reduzir os riscos de contrair o vírus, como também atendo pacientes psiquiátricos na residência, noto uma descompensação em diversos pacientes, pelo medo de desenvolver a doença, pelas incertezas quanto ao futuro e pela perda do pragmatismo e sociabilidade desencadeadas pela necessidade do distanciamento social. Estudos já apontam aumento do consumo de álcool, episódios ansiosos e depressivos.

CM: Quais comportamentos são comuns em pessoas afetadas pela Síndrome?

LA: Não conseguem se desligar totalmente de seus trabalhos e começam a apresentar descaso com as necessidades pessoais essenciais, como alimentação, sono e socialização, além disso, passam a ficar mais intolerantes, irritadas e tendem ao isolamento. Ao longo do tempo, passam a negar seus problemas e a condição atual, apesar da tristeza intensa, marcada por desesperança e indiferença. Os indivíduos acometidos têm períodos marcantes de confusão mental, na qual o indivíduo não sente seu corpo como usualmente ou de desconexão com  a realidade, além de perda do prazer e do sentido da vida.

CM: Qual o tratamento adequado para a síndrome?

LA: O tratamento é feito por acompanhamento com psiquiatras e psicólogos, pode ser necessário a prescrição de medicamentos, entretanto é fundamental adotar estratégias que auxiliem na mudança de hábitos para poder, gradualmente, retomar sua ocupação de maneira saudável e protetora. Tais medidas envolvem higiene do sono  (uma prática comportamental e ambiental para ajudar as pessoas com insónia leve e moderada), estabelecimento de rotinas saudáveis, com práticas de atividades físicas e lúdicas. Muitas vezes será preciso mudanças no trabalho, como função, setor, tarefas, prazos e metas, é inviável o tratamento sem mudanças sociais e laborais.

CM: Levando em consideração que a pandemia não acabou, como recuperar a mente e o físico dos profissionais da saúde?

LA: Os profissionais da saúde estão exaustos, a maneira que todos podem contribuir é respeitando as regras de distanciamento social, evitar aglomeração reduz a circulação do vírus, reduzindo a sobrecarga do sistema, dando mais tempo para os profissionais se recuperarem e otimizar o ritmo de trabalho. A vacinação não pode parar e precisa ser acelerada, todos os esforços devem ser voltados para resolução desta pandemia. Quanto ao nível individual, aqueles que se identificam com os sintomas de desgaste e estafa, precisam procurar ajuda profissional.

CM: O que as empresas deveriam fazer como suporte a fim de diminuir o crescimento deste transtorno psicológico?

LA: Primeiramente, a Síndrome de Burnout não é culpa do trabalhador e sim uma consequência dos espaços em que ele atua, por isso, as empresas precisam gerar mudanças no ambiente para evitar este problema. É preciso adotar medidas que geram motivação, valorização e o senso de pertencimento a um local com qualidade de vida e respeito, além disso, abrir uma via de comunicação bilateral, que seja eficiente e resolutiva. As empresas precisam ficar atentas às regras de segurança no trabalho e criar métodos de identificação precoce daqueles funcionários que venham a apresentar os primeiros sinais e sintomas da síndrome.